quinta-feira, 31 de maio de 2007

Pais, filhos, escolas & escolhas

Quando eu era criança e de repente na rua, ou em algum lugar me deparava com um maltrapilho, um mendigo ou alguém pedindo esmola, ficava sem graça, meio triste por não entender a situação de tal pessoa. Meu pai dizia: “a gente não sabe o que essa pessoa fez na vida, suas escolhas, por onde ela andou e o que já fez de errado”. Ele queria dizer que eu não podia me sentir culpada pela situação daquela pessoa, porque certamente a mesma deveria ter feito algo errado na vida. Talvez.

Meus pais são pessoas maravilhosas. Nunca me deixaram faltar nada. Até mesmo agora, beirando os 30, desempregada, conto com a ajuda deles. Sempre tivemos uma vida simples, sem luxo, mas nunca nada nos faltou. Meu pai sempre dizia: “estude para que você seja alguém na vida e não tenha que depender ou mendigar algo para alguém”. Fiz tudo certinho, mas ainda não alcancei esta “independência” tão sonhada por ele e por mim.

Quando fiz jornalismo, após tentar três meses o curso de letras, entrei na faculdade com a certeza de que minha profissão iria fazer diferença na vida das pessoas, me imaginava fazendo grandes reportagens de impacto social, denúncias (sempre acreditei que a função do jornalista fosse a de voz da população), enfim, que seria um pessoa útil para a sociedade. Meu pai nunca me desmotivou, mas também não me apoiava. Ele dizia que era uma profissão muito ingrata (pai sabe das coisas).

Hoje no fim da tarde do dia mais frio dos últimos 10 anos em Curitiba, saí caminhar pelo centro da cidade e me deparei com os carrinheiros e os meninos e meninas de rua que viram os lixos em busca de algo para comer, de papel, recicláveis, etc.. É uma cena comum que me incomoda sempre. Dói. Tenho pena dessas pessoas – mas não gosto de ter pena. Hoje o frio deixou a situação mais cruel e triste. É como se eu fosse de alguma forma responsável por tudo isso. Meu tão sonhado diploma guardado em alguma gaveta há seis anos perdeu a utilidade naquele instante devastador. Engoli seco e frio.

Foi depois assistir a isso, sem poder fazer nada, que voltei para minha casa aquecida, fiz um lanche, me agasalhei melhor e lembrei do que meu pai disse quando eu era criança: “a gente não sabe o que essa pessoa fez na vida, suas escolhas, por onde ela andou e o que já fez de errado”. Então pensei comigo: “bom, certamente ela não deve ter tido a escolha ou a sorte de ter um pai generoso como eu tive”.

4 comentários:

Autor disse...

É Pri, infelizmente não é todo mundo que tem a sorte de poder estudar e ter o apoio da família quando precisa. A desigualdade social é um mal que atinge a sociedade em que vivemos e faz com que nem todos tenham uma vida confortável. E eu iria além sobre o que seu pai disse, não só o jornalismo, mas a comunicação de um modo geral é uma área bastante complicada. Bjus.

Thaís disse...

Curioso como a maioria dos que fazem jornalismo têm essa visão de que podem ajudar alguém ou até mudar o mundo. Fui uma delas - mas confesso que essa tal visão atualmente está perdida em uma gaveta qualquer, talvez ao lado do meu diploma. Posso dizer que, por uma ou duas vezes, experimentei a sensação de contribuir para o bem-estar de alguém com uma matéria. É muito gratificante. Pena que há interesses muito maiores nos impedindo de colaborar com mudanças realmente necessárias...
Abraço!

Unknown disse...

Realmente o contraste muitas vezes choca e dependendo da altura de visão, todos os problemas parecem do mesmo tamanho. Enquanto aos olhos nus encarados que encaramos na crua realidade de frente; o peso aumenta e muito. Uma noite fria ou todas? Na rua, em casa; onde? Todas as noites encostando nos contra-ventos da cidade e torcendo pra acordar. A vida ao conforto com ou sem fogo, banho quente? Satisfação e pão; desconforto e exaustão, no meio desse vasto mundão valorizemos por menos temos, pois já é muito e pouco o que temos. Todos sempre aqui e ali aprendendo no vir e ir na caminhada rolante e sabemos q por mais miséria que exista, sempre resta um sorriso; seja de alegria, de amor ou de esperança. Acho que a comunicação está mal. Só mostram o lado ruim aumentando o mau. As pessoas devem falar de coisas boas e pensar coisas boas. 97% das reportagens mostram o trágico e os 3% sobram pra finalizar os jornais iludindo a população de que existe um mundo bom. Sou a favor de menos atenção ao crime, ao tráfico, a negatividade e ao "chiqueiro" que é o governo. A família; feliz de quem tem uma boa família...

Daniel Dedo disse...

Pri, inclua em um post que, quando eu voltar da Bahia, eu escrevo??? Obrigado, beijos e curta esse friozinho.
Mais beijos.
Daniel